sábado, 11 de maio de 2013

Encontro com Nicolás Maduro e os desafios para o avanço da revolução bolivariana


Por Luciana Genro.

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, recebeu ontem em Brasília representantes dos partidos que apoiam seu governo e/ ou a Revolução Bolivariana, e dos movimentos sociais. Digo partidos que apoiam o governo, e não só a Revolução Bolivariana, pois o Governo Lula e agora Dilma, e seus partidos, tem atuado para deter e não para apoiar e desenvolver o processo revolucionário. Aliás, a convivência com os limites desenhados pelo governo brasileiro é, desde os tempos de Chávez, parte dos limites do próprio processo bolivariano.

Dentre os representantes do PSOL estávamos eu, os deputados Chico Alencar e Ivan Valente e o senador Randolfe Rodrigues. Maduro veio ao Brasil para buscar apoio do governo brasileiro, o que não só é legitimo como extremamente necessário, visto que a oposição golpista e fascistoide segue tentando desestabilizar o governo legitimamente eleito. O evento foi, naturalmente, hegemonizado pelas forças políticas e movimentos sociais que apoiam o governo Dilma, como a UNE, a FUP (Federação dos Petroleiros) e o MST, representado por João Pedro Stédile. O conteúdo do discurso do presidente Maduro também não fugiu muito deste script, o que já era previsto.

A sua retórica, entretanto, tem tons diferentes da cantilena lula- dilmista, a começar pela definição, feita logo no inicio da sua fala, de que a Venezuela tem “um governo legitimo, uma revolução popular no poder”. Disse ainda que aqueles que chegam ao poder e não se apoiam na mobilização do povo, estão fadados a fazer apenas um “governito”.

Chamou a atenção também o momento em que ele citou os membros do governo presentes, e referindo-se ao representante das Forças Armadas disse que o exercito é bolivariano, anti-imperialista, chavista e o general presente gritou ” e socialista”. Vejam que diferença do governo brasileiro, que sequer enfrenta o problema da punição aos crimes da ditadura militar! Na Venezuela, Chávez provocou um processo de transformação das Forças Armadas, mas ele ainda é inconcluso, e sabe-se que na alta cúpula reside um dos focos de resistência às medidas necessárias para aprofundar a revolução Bolivariana.

É claro que a direção do movimento e dos governos bolivarianos tem sérios limites e contradições. As alianças que a direção da corrente bolivariana tem com setores burgueses e, sobretudo, com a burocracia estatal, nefasta para os interesses do movimento de massas, são posições que também contribuem no retrocesso do processo. Tais posições burocráticas se expressaram na desastrosa e nefasta política burocrática e pró-ditaduras durante a primavera árabe, posições defendidas por Chávez diretamente.

Mas nesta noite em Brasília, o que fez, ao meu ver, muita falta no discurso de Maduro foi uma referencia ao enfrentamento dos problemas que ameaçam a revolução Bolivariana, questões abordadas pelo próprio Chávez no último discurso que fez aos seus ministros, pouco antes de embarcar para Cuba para sua derradeira cirurgia. Neste discurso, que ficou conhecido como Golpe de Timão, uma expressão que podemos traduzir como “dar uma virada”, Chávez fala do problema da burocracia que ameaça o processo, da necessidade do governo não aparelhar os movimentos sociais e do fato de que a Venezuela ainda não é socialista pois o estado ainda é burguês, necessitando portanto de medidas concretas que avancem neste caminho. Antes de morrer Chávez fez uma profunda crítica e autocrítica, apontando a necessidade do aprofundamento da revolução e assim demonstrando-se um verdadeiro revolucionário. Maduro não tocou nestes desafios legados por Chávez. Ao final da reunião, fomos nos despedir dele e eu então perguntei: presidente, vamos dar o golpe de Timão, conforme orientou o comandante Chávez? Ele respondeu sim, vamos dar!

Pelo que se pode perceber, o processo está em aberto. Os próximos passos de Maduro serão decisivos. Os movimentos sociais e os grupos políticos, como Marea Socialista, que apoiam o processo mas não se acomodam na burocracia também têm grande papel a cumprir. A vitória apertada de Maduro preocupa a todos os apoiadores da revolução Bolivariana, pois um retrocesso na Venezuela seria um desastre para toda a América latina. O bolivarianismo sem Chávez certamente perde em radicalidade, mas o povo da Venezuela já avançou muito seu nível de consciência socialista e revolucionária, portanto não será uma tarefa fácil para a direita impor um retrocesso. Mas não nos iludamos, na história, nada fica estático. O que não avança, retrocede. O desafio está posto.


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