sábado, 30 de junho de 2012

A COPA DE 2014, A POLÍTICA E O PODER. OS DESMANDOS DE 1% DA POPULAÇÃO


      No debate sobre a Lei Geral da Copa 2014 no Brasil, nosso país tem sido tratado da forma como sempre foi tratado pelos países centrais do capitalismo mundial: Uma ex-colônia, um país subdesenvolvido. Se já não bastasse termos sido historicamente saqueados pelos principais países da economia capitalista mundial, ainda somos estigmatizados como povo pouco capaz intelectualmente e atrasados culturamente. É uma ideia etnocêntrica, ou seja, se colocam como centro e referência para os povos “atrasados”. O perfil do secretário-geral da FIFA Jérôme Valcke demonstra esta situação. Quando vem ao Brasil cobra de forma veemente o governo brasileiro, como numa relação patrão X empregado. Logicamente, esta posição advém da elite dos países centrais e não do seu povo. Até por que a posição social de dominância é inerente aos que exploram, os explorados, via de regra, não se colocam enquanto “seres superiores”.
 Mas, a pergunta que nos cabe é: Por que o Brasil se subjuga, muitas vezes, a este tipo de comportamento? A resposta mais plausível que se expressa é a política. Tanto a nossa, interna, como a externa. Lembram como o então governo Lula conseguiu trazer a copa para o Brasil? Apesar de ainda não haver comprovação, há fortes indícios de compra de votos por parte do governo brasileiro. Mas a política, no âmbito das relações inter-burguesas, é ainda mais podre. Tentemos pensar agora na relação do Governo Federal com os magnatas do futebol brasileiro. Podemos caracterizar, de forma geral e correndo o risco de se equivocar em conceitos pormenores dessa caracterização, os clubes brasileiros como empresas privadas. Possivelmente, pagam impostos e tributos exigidos pelo Estado brasileiro, tem receita própria e participam de grandes eventos, inclusive faturando muito com isso. Com a copa do mundo, alguns estádios estão sendo construído financiados com nosso dinheiro e, pós copa, serão entregues a algumas dessas empresas privadas. O “Itaquerão” é o exemplo mais conhecido. E por que o Itaquerão foi escolhido como estádio a ser construído com investimento de dinheiro público e repassado a uma empresa particular? Houve plebiscito popular dando poder de decisão ao povo sobre onde investir seu próprio dinheiro? O primeiro questionamento nos remete rapidamente a uma resposta do senso comum, mas que contém traços de ciência: troca de favores; a segunda soa como uma piada, pois a relação Estado X sociedade no Brasil inexiste. A democracia, por mais progressiva que seja em relação a outros períodos históricos, é majoritariamente da elite, de 1% da população. Além disso, estamos assistindo em todo Brasil as precárias condições de trabalho para os operários que constroem os estádios, inclusive com algumas greves de trabalhadores da construção civil nos estádios da Copa.
   Outro debate gritante é sobre o consumo de bebidas alcoólicas dentro dos estádios durante a copa. No Brasil, há alguns anos atrás, houve um importante avanço no que tange esta questão. A proibição de comércio de bebidas alcoólicas dentro dos estádios contribuiu na queda dos registros de violência dentro dos estádios, no entanto, com a vinda da copa, haverá uma flexibilização temporária das leis brasileiras para que, entre outras coisas, possa haver a comercialização de bebidas alcoólicas nos estádios durante a copa.
            A explicação mais razoável para isso, se é que existe explicação nesta insanidade, advém da ideia de que grandes empresas capitalistas mundiais querem lucrar com a copa e, quando se trata de encher os bolsos dos capitalistas, a política e o poder remodelam até mesmo dispositivos legais de uma sociedade. Assim fazem por que os políticos, no geral, mantêm relações intrínsecas e obscuras com grandes empresas visando, evidentemente, algum tipo de financiamento. Legal ou não, para eles, é secundário. Quando temos uma direção política entreguista isso se torna ainda mais fácil. Já imaginaram se este processo ocorreria em países como Bolívia, Venezuela, Equador ou Cuba? Muito provavelmente não, porém, evidentemente, a copa do mudo não se realizaria nesses países, não atualmente.
       Mas, há outro lado nessa história.
O público dos jogos, pelo valor do ingresso, será 1% da população mundial. Ou seja, a elite. Esses, no imaginário que eles mesmos nos impõem, são civilizados. Quem prática violência nos estádios tem fenótipo estabelecido, apesar das variações: é preto e pobre. Liberemos então a bebida para o povo branco civilizado, quando eles forem embora regularizamos novamente a lei para adestrar os pretos e pobres. Nesse quadro, não surpreende que o novo presidente da CBF tenha sido informante direto do Regime Militar brasileiro que assassinou milhares de pessoas e desprezava qualquer tipo de ato democrático.
       O quadro da copa de 2014 beira o ridículo. Ainda não falamos, por exemplo, das milhares de pessoas que estão sendo despossuídas das suas posses para viabilizar as construções arquitetônicas e de grande pompa. Vide o caso de Pinheirinho, em São Paulo, sabemos como isso funciona.
    Entretanto, há resistência. A vinda da copa do mundo foi comemorada por todos nós, brasileiros, por se tratar de futebol, nossa paixão nacional. Assim, de início, o sentimento popular se comoveu com a possibilidade de sediar a copa. No entanto, os mandos e desmandos da FIFA, da CBF e do governo brasileiro, aliado a fraca atuação da nossa seleção brasileira, começam a pipocar questionamentos populares. O deputado do RJ Romário, maior goleador brasileiro dos últimos anos, tem se destacado nesse debate, apontando as contradições do processo e denunciando as irregularidades, assim como os parlamentares do PSOL Ivan Valente, Chico Alencar, Jean Wyllys e Randolfe Rodrigues.
    Precisamos disputar este processo. Nós, partidários de uma política alternativa ao das elites, devemos fortalecer e criar Comitês Populares de Fiscalização das Verbas da Copa e fazer este debate nos diversos espaços da sociedade civil organizada, visando a articulação dos movimentos sociais e dos partidos políticos para que possamos disputar a intenção de gastos governamentais para a copa,  debatendo melhorias de obras que fortaleçam o serviço público e contribua na melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro, pautar novos elementos  que possam ressignificar o futebol e que possamos buscar a consciência popular demonstrando que o poder e a política não podem estar nas mãos da elite ou de seus agentes. Poder popular e domínio público é o que necessitamos para virar esse jogo.


Helder Porto Oliveira é Presidente do PSOL Pelotas, professor de Sociologia e acadêmico de Psicologia.

2 comentários:

  1. Muito bem lembrado o fato do deputado Romário estar apontando as contradições do processo e denunciando as irregularidades. COMO JOGADOR SEMPRE ACHEI O ROMÁRIO MUITO EXIBIDO E METIDO A MELHOR QUE OS OUTROS, MAS COMO DEPUTADO ESTÁ SENDO UM DOS POUCOS REALISTAS EM RELAÇÃO A COPA DE 2014.

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  2. E além das contradições citadas pelo Helder Porto Oliveira, outra contradição que me irrita é que os professores quando fazem greve são tachados de "um bando de baderneiros que não querem trabalhar" e não veem o lado dos "coitados" que estão no poder. Mas esta porcaria de copa parará o país por um mês, e esta não é tachada e nem acusada de parar o país.

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