Marcelo Freixo (PSOL) teve uma campanha de relevante importância e resultado significativo. Ao enfrentar Eduardo Paes (PMDB) à Prefeitura do Rio de Janeiro, teve que lutar contra a campanha dele que tinha recursos de inúmeras empresas para publicidade e com muito mais tempo de TV. Mas, conquistou a população do Rio de Janeiro com uma militância pronta para mudar a realidade triste que muitos brasileiros vivem. Com o slogan: "Não ganho um real, estou na rua por um ideal", a militância carioca do PSOL fez política consciente, digna e convicta de que a mudança é possível. Em entrevista à Carta Capital, Marcelo Freixo fala sobre o mensalão e uma nova política.
CartaCapital: Qual é o significado de quase um milhão de votos que você conquistou no Rio de Janeiro?
Marcelo Freixo: Perdemos uma reeleição, não uma simples eleição.
Perdemos para uma máquina poderosa, verdadeiro laboratório do capital
brasileiro, à luz de todos os investimentos em curso, onde – não por
acaso - a maior diferença de votos se deu nos lugares onde foram feitas
obras. Lutamos contra uma aliança de 20 partidos, tendo só 1 minuto e
22 segundos de televisão (contra os 16 minutos de Paes), mas compensamos
esta desvantagem com uma militância apaixonada e uma intensa
participação da sociedade. Conseguimos os nossos votos – 28% – também em
áreas tradicionalmente difíceis para os movimentos sociais – como a
zona norte e oeste – e nos consolidamos como uma nova alternativa de
esquerda.
CC: Quais as razões da sua satisfação na derrota?
MF: O fato de ter aberto um diálogo permanente com a sociedade, que
se ampliou graças às redes sociais. A nossa foi uma campanha vitoriosa
também pelos métodos participativos. Conseguimos reafirmar que é
possível e necessária uma politica diferente, em contraste com a lógica
da governabilidade entre as cúpulas partidárias. "Não ganho um real,
estou na rua por ideal" estava escrito nas camisetas dos nossos
militantes. Os nossos resultados se explicam também com essa escolha de
puro voluntariado, única no Brasil: surgiram autonomamente mais de 100
comités de cidadãos, arrecadamos pela internet contribuições que nem
Marina (Silva) e Dilma (Rousseff) conseguiram nas campanhas
presidenciais. O grande desafio será de manter essa mobilização de forma
permanente. Trabalharemos para que os vários comitês de cidadãos (sobre
moradia, economia, ambiente, esporte, etc.) se transformem em
estruturas permanentes, imprimindo jornais, elaborando propostas pela
cidade, em plena autonomia.
CC: Personagens importantes da cultura declararam que Marcelo
Freixo representa a nova política brasileira. Você se identifica com
essa definição?
MF: Nós queremos representar e construir exatamente isso. Veja os
outros partidos: todos aparecem só durante a campanha eleitoral e,
infelizmente, isso acontece também com o PT, que está recolhendo os
frutos do que plantou. No Rio, em particular, virou um satélite do PMDB.
Tomara que eles entendam e mudem daqui para frente. Alám disso, a
participação que caracterizou o nosso movimento teve o mérito de reduzir
a personificação da política brasileira. Essas são as diferenças entre
nós e os outros partidos. Mais do que partidos, existem muitas siglas no
Brasil. O PSOL sai diferente desta eleição, ao lado de um movimento que
é maior do que o partido; o que determinará uma recíproca contaminação.
CC: Como projetar um governo futuro sem alianças com os partidos, digamos, tradicionais?
MF: O processo de participação da sociedade não acabou no dia 7 de
outubro. Naquela data teve um novo início, para acumular mais força nos
anos futuros. Esta é logica da "primavera carioca", como foi chamada
pelos jovens. Estou disposto a repetir o desafio da eleição em 2016,
mas a questão central é consolidar a aliança com a sociedade civil,
construir uma oposição de qualidade, que não faça só criticas, mas que
proponha alternativas qualificadas. Eventuais alianças em 2016 devem ser
o fruto deste trabalho de quatro anos na sociedade, através da
elaboração de propostas dos diferentes núcleos e comitês. Queremos
chegar assim a uma nova correlação de forças, evitando qualquer
compromisso de cúpula. Em perspectiva, PT e PDT, por exemplo, que podem
ter uma concepção de cidade próxima à nossa, serão bem-vindos em uma
aliança para a mudança. Com PMDB e PSDB temos uma concepção de cidade
diferente e alternativa: com eles não será possível.
CC: Inevitável refletir nesses dias sobre o "mensalão". Qual é a sua posição à respeito?
MF: Me assusta um pouco, hoje, a postura do PT em relação ao
mensalão. Erra de novo quando afirma que o julgamento é um grande golpe,
que não respeita o passado das pessoas. Acho que o melhor caminho para o
PT seria admitir o inevitável: o mensalão existiu, é um fato. O
julgamento está sendo feito pelo Supremo e não pela Rede Globo. Se
defender com a argumentação que foi só caixa dois, eu considero a pior
saída. Independentemente da postura da mídia – que todos sabemos não
poderia ser diferente – acho que o PT deveria tratar de dar uma virada
de página importante, e se – como parece – tem gente que está pensando
nisso, eu acho ótimo. O PT é importante pela democracia no país. Ao
mesmo tempo, me entristece o Lula – pelo qual eu tenho um afeto
gigantesco – apoiando Eduardo Paes ou apertando a mão do (deputado
federal Paulo) Maluf. Agora, tem que ser claro que o PT não vai acabar
com o mensalão. Certa prática de governo, baseada na corrupção, sempre
existiu e, antes do PT, foi o instrumento de governo do PSDB, do DEM e
de todos eles. O problema se acentuou quando também o PT quis repetir
aquelas práticas, olhando pela governabilidade da mesma forma como os
outros partidos sempre olharam. Não me interessa que os fins eram
diferentes se os meios foram iguais.
De qualquer forma, me preocupa que, entre tantos comentários, ninguém
fala que sem uma reforma politica o mensalão nunca será divisor de
águas na política brasileira, como já se notou aqui no Rio na eleição
marcada por todos os problemas que geraram os mensalões. Se o poder
econômico e o financiamento privado continuarão determinantes para a
política, é uma bobagem pensar que a justiça vai favorecer uma nova
política. Não estou com isso dizendo que o julgamento do mensalão não
seja importante; mais do que isso, acho que ele é justo. Agora, este
julgamento não nos dá outra política nem outro Judiciário. A ideia de
que o Judiciário é o espaço salvífico da politica é um equivoco.
Fonte: Carta Capital
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